(Autor: Professor Caviar)
Um aspecto muitíssimo estranho acontece no mercado literário. Os livros que o escritor Humberto de Campos havia escrito em vida, entre publicações de seu tempo e alguns títulos póstumos, estão praticamente fora de catálogo, com acesso relativamente dificultado nas livrarias brasileiras.
A última vez que a obra completa de Humberto foi lançada foi em 2014, por ocasião dos 80 anos de sua morte, e mesmo assim foi um grande volume reunindo todos os seus trabalhos - incluindo o polêmico Diário Secreto, publicação póstuma de textos que ridicularizavam personalidades da época do autor maranhense - , o que resultava num título muitíssimo caro e pouco acessível, devido à sua baixa tiragem. Hoje até essa coleção está fora de catálogo.
Embora o acervo de Humberto seja relativamente acessível através de sebos ou bibliotecas, nem todos os títulos lançados por ele são fáceis de serem encontrados, o que faz com que o leitor menos iniciado, não habituado a garimpar obras raras, seja menos estimulado a conhecer a obra original de Humberto de Campos.
LOBBY "ESPÍRITA"?
No seu curto período de vida, Humberto de Campos foi um autor bastante popular e com um talento comparável a nomes que, como ele, fizeram parte da Academia Brasileira de Letras (quando ela era relevante e não aceitava figuras fúteis como Merval Pereira, que só lembra um "imortal" pelo visual retrô que remete a 1910, sobretudo pelo bigode).
A comparação com Machado de Assis é certeira, pela forma correta e acessível com que Humberto escreveu suas obras. Numa comparação ligeira, em termos de popularidade, Humberto estava para Machado assim como João Ubaldo Ribeiro está para Jorge Amado, uma popularidade significativa, mas relativamente secundária.
Mas isso não é pretexto para que os livros de Humberto estivessem fora de catálogo. Mais acessíveis estão as obras fake, atribuídas à parceria "mediúnica" com Francisco Cândido Xavier, que nem de longe lembram o estilo original do escritor maranhense, mas em muitos casos trazem semelhanças fortíssimas com o estilo dos depoimentos pessoais do "médium".
Há uma forte suspeita de que a não publicação dos livros originais do escritor maranhense sejam um artifício para evitar comparações entre as obras originais e as supostas obras espirituais, porque basta uma leitura mais atenta para apontar deslizes grosseiros e gravíssimos que causaram a inquietação, com muita razão, dos mais renomados literatos contra Chico Xavier.
Chico chegou a ser réu no processo judicial movido pelos herdeiros de Humberto, mas a famosa seletividade da Justiça brasileira - capaz de manter preso um pobre furtador de frutas, enquanto concede liberdade a homicidas ricos - deixou impune o "médium", beneficiado pelo status de "ídolo religioso", que garante imunidade até para quem comete erros graves e preocupantes. A Justiça costuma poupar privilegiados sociais de sofrerem punições mesmo com crimes comprovados.
Beneficiado pela impunidade, Chico Xavier teve o sinal verde para seguir com o "Humberto de Campos" fake, lançando, logo em 1945 - um ano depois do processo e julgamento - , a obra Lázaro Redivivo, de fortíssimo conteúdo igrejeiro que faria um espírita autêntico ter crises de vômitos. A única condição usada foi a adoção de um pseudônimo, Irmão X, combinada por Chico e seu tutor e presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas, parodiando o codinome Conselheiro XX que Humberto havia usado em vida.
O que questionamos, diante do "sumiço" de Humberto de Campos das livrarias brasileiras, é até que ponto o "espiritismo" brasileiro exerce um lobby muito grande no mercado editorial. Sabe-se que o "espiritismo" brasileiro é blindado pela Rede Globo de Televisão e Chico Xavier é, na prática, "padroeiro da Globo", até pela pretensa imagem de "espírito iluminado" que, embora agrade em cheio muitas pessoas, mais parece ter saído das mentes de algum habilidoso autor de novelas globais.
Ver que obras fake acabam prevalecendo sobre as obras originais é assustador, ainda mais que o Humberto de Campos original é bem diferente do que apresenta o suposto espírito, pois as obras "mediúnicas" são muito pesadas de se ler, são cansativas e trazem um igrejismo deprimente e panfletário.
Essa manobra, embora ocorra em favor das "boas qualidades da religiosidade humana", é um atentado à memória literária brasileira e uma ofensa grave ao legado de Humberto de Campos. Além disso, dificultar o acesso dos leitores às obras originais de Humberto, em benefício de supostas obras espirituais de conteúdo fortemente religioso, traz um forte indício de fraude, pois o não-acesso dos livros originais de Humberto elimina a possibilidade de uma leitura comparativa.
E isso tem um propósito: dificultando os leitores comuns de conhecer a obra original de Humberto de Campos, faz-se com que a obra "mediúnica" prevaleça e permaneça imune a comparações que, mediante uma leitura mais atenta, identificariam fraudes grosseiras nas obras "espirituais".
Mas esta manobra acaba também mostrando a farsa. Escondendo o Humberto de Campos original da maioria dos leitores brasileiros, acaba-se revelando a tarefa fraudulenta de parte de Chico Xavier, Wantuil de Freitas e da equipe editorial da FEB, que, através de seus representantes atuais, tentam proteger a farsa das "obras espirituais" de qualquer análise comparativa dos livros originais, pois as disparidades de estilo são muito, muito grandes.
Ver que a mentira tenta se proteger as revelações da verdade, que poderiam pôr a perder a reputação de um ídolo religioso famoso como "grande vendedor de livros", é bastante preocupante. Só mesmo no Brasil, em que, dependendo dos interesses e das conveniências, a mentira pode se posicionar acima da verdade. Infelizmente, o Brasil tornou-se o paraíso da pós-verdade.
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