(Autor: Equipe Dossiê Espírita)
Já divulgamos neste blogue uma mensagem atribuída a Humberto de Campos, publicada pela FEB depois do episódio do processo dos familiares do falecido escritor, mas ainda em 1944, registrada por Miguel Timponi, advogado da federação, no livro A Psicografia Ante os Tribunais.
Fizemos uma análise parcial da mensagem, apenas apontando os principais pontos que indicam que a mensagem, na verdade, teria sido escrita por Antônio Wantuil de Freitas em parceria com o anti-médium mineiro, Francisco Cândido Xavier, como forma tendenciosa de comover aqueles que assistiam atônitos aos desdobramentos do processo judicial daquele ano.
Desde que Humberto de Campos, ainda em vida, resenhou o livro Parnaso de Além-Túmulo, de Francisco Cândido Xavier, este investiu na mais absoluta obsessão pelo escritor, depois que este faleceu em 1934, com apenas 48 anos.
Chico teria se vingado de resenha irônica, criando um "espírito Humberto" com estilo de prosa completamente diferente ao original, tornando-se um dos poucos casos de alguém que permanece até hoje (mesmo após o falecimento do anti-médium, em 2002) impune e abertamente aceito no crime de usurpação e apropriação indébita da memória de um autor falecido. Hoje, Chico Xavier é visto praticamente como "dono" do legado de Humberto de Campos.
Nele os familiares de Humberto de Campos, a viúva e os filhos, moveram, através do advogado Milton Barbosa (que viu irregularidades sérias na obra literária atribuída ao espírito, por contradizerem ao que ele produziu em vida), pediam a verificação das obras da FEB que levam o nome do escritor.
A intenção era saber se a autoria espiritual era verdadeira ou não. Se fosse, os familiares receberiam pelos direitos autorais. Se não fosse, Chico Xavier e a FEB teriam que pagar uma multa por apropriação indébita do nome do falecido escritor, figura destacada da Academia Brasileira de Letras entre os anos 1920 e o começo dos anos 1930.
A Justiça da época julgou a ação improcedente, criando um empate jurídico que beneficiou a FEB e Chico Xavier, dando origem ao mito que deslumbra muitos seguidores até hoje nas mídias sociais.
Todavia, notamos que a mensagem que o suposto Humberto de Campos divulgou na época do julgamento é falsa, pelas próprias caraterísticas textuais que não só contradizem o estilo original do escritor, como apontam estilos que se alternam entre os de Chico Xavier e os de Wantuil (é só ler, neste caso, o livro Síntese de O Novo Testamento, sob o pseudônimo Mínimus).
Segue abaixo a referida mensagem, que aqui aparece separada em parágrafos, para uma análise detalhada. Note-se que alguns trechos correspondem, em estilo de escrita, ao estilo que Chico Xavier escreveu ou declarou em frases divulgadas atualmente no Facebook.
Em contrapartida, a mensagem mostra um "Humberto de Campos" deprimentemente religioso, diferente da prosa culta, laica e descontraída do seu estilo original:
"Não desconheço minha pesada responsabilidade moral, no momento quando o sensacionalismo abre torrente de amargura em torno de minh'alma".
Este trecho se identifica plenamente com o estilo de escrever de Chico Xavier, com a semelhança explícita das frases que o anti-médium mineiro tanto lançou e se tornaram bastante famosas e muito populares, acessíveis nas mídias sociais.
"Recebeu-me a Federação Espírita Brasileira, generosamente, em seus labores evangélicos, publicou-me as páginas singelas de noticiarista desencarnado, concedendo-me o ingresso na Academia da Espiritualidade. E continuei conversando com os desesperados de todos os matizes, voluntariamente, como o hóspede interessado em valer-se da casa acolhedora".
Embora seja uma argumentação combinada entre Chico e Wantuil, observa-se que a redação final do referido parágrafo se remete mais a Wantuil, até por estar puxado a uma retórica pretensamente científica e linguagem tipicamente editorial, como é de praxe de um chefe de uma instituição.
"Eis, porém, que comparecem meus filhos diante da justiça, reclamando uma sentença declaratória. Querem saber, por intermédio do Direito Humano, se eu sou eu mesmo, como se as leis terrestres, respeitabilíssimas embora, pudessem substituir os olhos do coração. Abre-se o mecanismo processual, e o escândalo jornalístico acende a fogueira da opinião pública. Exigem meus filhos a minha patente literária e, para isso, recorrem à petição judicial. Não precisavam, todavia, movimentar o exército dos parágrafos e atormentar o cérebro dos juízes. Que é semelhante reclamação para quem já lhes deu a vida da sua vida? Que é um nome, simples ajuntamento de sílabas, sem maior significação? Ninguém conhece, na Terra, os nomes dos elevados cooperadores de Deus, que sustentam as leis universais; entretanto são elas executadas sem esquecimento de um til".
Neste trecho, em que um pretenso "Humberto de Campos" pateticamente desvaloriza sua necessidade de provar a patente literária exigida pelos herdeiros do escritor maranhense, combina-se o sentimentalismo de Chico Xavier e uma argumentação agressiva e falsamente científica de Wantuil, que também teria escrito a redação final do texto, em que pese algumas palavras tipicamente xavierianas, como nas três últimas frases do parágrafo.
A argumentação é patética e hipócrita, uma vez que soa muito estranho que um autor se permita omitir-se de responsabilidade autoral, desafiando a lógica das coisas e dos fatos em nome dos "olhos do coração" e acusando a cobertura do processo movido contra Chico e a FEB de "escândalo jornalístico" que acende a "fogueira da opinião pública". O estranho "Humberto" permite-se proteger em um pretenso anonimato para fazer valer sua "mensagem".
A argumentação de que "ninguém conhece na Terra os nomes dos elevados cooperadores de Deus" é, ironicamente, um ajuntamento de sílabas que permite justificar "nobremente" uma fraude, em que a falsidade ideológica é "permitida" pela desculpa de que o valor dos atos está necessariamente na omissão da identidade de seus responsáveis.
"Na paz do anonimato, realizam-se os mais belos e os mais nobres serviços humanos."
Frase escancaradamente escrita por Chico Xavier, e desta vez somente ele, sendo absoluta e rigorosamente idêntica às frases que os internautas adoram mostrar nas mídias sociais, sobretudo Facebook.
"Quero, porém, salientar, nesta resposta simples, que meus filhos não moveram semelhante ação por perversidade ou má-fé. Conheço-lhes as reservas infinitas de afeto e sei pesar o quilate do ouro da carinhosa admiração que consagram ao pai amigo, distanciado do mundo. Mas que paisagem florida, em meio do mato inculto, estará isenta da serpe venenosa e cruel? É por isto que não observo esse problema triste, como o fariseu orgulhoso, e sim como o publicano humilhado, pedindo a bênção de Deus para a humana incompreensão".
Uma típica frase de duplo sentido. O estranho "Humberto" parece demonstrar afeição a sua família, mas também venenosa desconfiança, quando alude a presença de "serpe venenosa e cruel" numa "paisagem florida em meio do mato inculto". Contraditoriamente, reconhece que seus filhos não o processaram por perversidade ou má-fé, mas depois alega que eles podem não estarem isentos de intenções malignas ("serpe venenosa e cruel").
Pois aqui quem destila o seu veneno é o suposto espírito, bem no famoso ato de "morde e assopra", em que primeiro demonstra afeição a seus familiares, desmentindo perversidade e má-fé de sua ação judicial, mas depois suspeitando de intenções maldosas por trás desse processo, para em seguida dizer que não observa esse "problema triste" como "fariseu orgulhoso" e "sim como o publicano humilhado".
Diante desse parágrafo confuso, traiçoeiro e contraditório, observa-se algumas argumentações sentimentais típicas de Chico Xavier, mas os trechos ferinos indicam também a contribuição de Wantuil, que parece ter escrito a redação final.
"Diante, pois, do complicado problema em curso, ajoelho-me no altar da fé, rogando a Jesus inspire os dignos juízes de minha causa, para que façam cessar o escândalo, em torno do meu Espírito, considerando que o próprio Salomão funcionasse nessa causa, ao encarar as dificuldades do assunto, teria, talvez, de imitar o gesto de Pilatos, lavando as mãos".
Esse parágrafo tem muito mais a cara de Chico Xavier, prevalecendo o seu estilo de analisar os problemas, usando principalmente desculpas típicas, como "ajoelho-me no altar da fé, rogando a Jesus inspire os dignos juízes de minha causa", bem típica do anti-médium mineiro. O religiosismo extremo, a choradeira das palavras dóceis, o parágrafo é escancaradamente de Chico Xavier.
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